O pedido de doações e a venda de produtos dentro dos ônibus já fazem parte da rotina de quem usa o transporte coletivo. Entre os passageiros, é comum a desconfiança sobre o que é feito com o dinheiro arrecadado. Por outro lado, as instituições que trabalham com a reabilitação de dependentes químicos defendem a prática como fonte de renda e como divulgação dos projetos a quem não tem condições de arcar com tratamentos particulares.
As linhas mais frequentadas por quem faz os pedidos de ajuda são as que usam biarticulados ou fazem integração em terminais. A abordagem começa assim que o ônibus deixa a estação-tubo, e rapidamente chama a atenção dos passageiros com um “bom dia”, seguido pelo relato sobre as conquistas do tratamento.
Pedidos
Depois de apresentados, os representantes das instituições percorrem o veículo distribuindo seus produtos – em geral canetas, chaveiros e adesivos – que são vendidos a valores baixos. Também é constante o pedido feito por pessoas com diversas deficiências, que usam bilhetes ou mostram seus problemas na tentativa de sensibilizar os passageiros.
O Paraná Online entrou em contato com duas entidades que atendem dependentes químicos e usam esta estratégia: Instituição Manassés e Missão Resgate. As duas alegam que, apesar de proibido por lei, o comércio dentro dos ônibus é o que mantém os trabalhos.
Instituições se explicam
“Não entramos nos ônibus para vender drogas ou assaltar. A instituição tem trabalho sério, para ajudar quem precisa. Quantas pessoas são alcançadas por este trabalho, mães que estão indo trabalhar desesperadas porque o filho é envolvido com drogas e está desaparecido há dias?”, argumenta Marcos Paulo de Carvalho Lopes Granado, presidente nacional da Missão Resgate.
“As palestras nos coletivos atingem o povo de classe mais baixa, que não tem condição de custear a recuperação. Hoje as clínicas são bastante caras”, diz.
Kits
O presidente nacional da Manassés, Douglas Marques Correa, também concorda com a estratégia. “Temos a necessidade de tentar angariar recursos que não conseguimos arrecadar com o governo. Não pedimos doações, distribuímos os kits com canetas e adesivos em troca de doações”, diz. Ele aponta a própria equipe – que já passou por tratamento na entidade – como pessoas que não teriam condições de pagar pelo atendimento, mantido com o que é arrecadado nos ônibus.
Atividade proibida
Apesar de comum, o pedido de doações e a venda de produtos nos ônibus são proibidos pelo decreto municipal 1356/2008, que define como dever do usuário do transporte coletivo “não comercializar, panfletar ou pedir esmolas no interior dos veículos, estações-tubo, pontos de ônibus e terminais de integração”.
De acordo com a Urbs, a orientação aos motoristas de ônibus é solicitar que os pedidos sejam interrompidos. Caso não seja atendido, o motorista pode parar de rodar até que o pedinte saia do veículo. É possível ainda solicitar a presença de um fiscal, que, assim como o motorista não pode entrar em confronto com o passageiro. Em casos mais graves, a Guarda Municipal deve ser chamada.
Alternativa humanizada
Na avaliação do psicólogo e coordenador do curso de Psicologia na PUC-PR, Naim Akel Filho, tratamentos em comunidades terapêuticas é a alternativa mais humanizada em comparação aos antigos manicômios, uma vez que valoriza os pacientes e exerce papel fundamental especialmente no tratamento contra álcool e drogas. “Algumas delas são excelentes, possuem corpo clínico muito eficiente, mas muitas ainda requerem aperfeiçoamento”.
A adoção de responsabilidades pelos pacientes também é considerada por Akel bastante importante no processo de reinserção social, mas ele questiona a estratégia de venda de produtos nos ônibus. “Não sou contra fazer o paciente trabalhar, a divisão de tarefas, colocar o sujeito ativamente no processo, faz parte das comunidades, mas acredito que é preciso segurança ao expor o sujeito a pedir dinheiro. Também não sei se o ônibus é o local mais indicado. Existem outras maneiras para arrecadas recursos”, afirma.
PrOn – Foto: Ciciro Back.