O enorme escândalo de corrupção no Brasil saltará dos noticiários para as salas de cinema e o canal de conteúdo em streaming Netflix no próximo ano, quando diretores concorrentes transformarão o suspense da vida real em entretenimento.
Há dois anos os brasileiros assistiram, surpresos e aterrorizados, ao início da chamada “Operação Lava Jato”, que já teve diferentes alvos: do ex-presidente Lula até os ricos executivos, alegando apropriação indébita em massa na Petrobras.
Poder, dinheiro, traição, investigadores destemidos – o que mais um roteirista poderia querer?
“Nosso objetivo é fazer um filme comercial”, disse o diretor Marcelo Antunez, cuja produção, intitulada “Polícia Federal – a lei é para todos”, tem estreia prevista para maio.
A história da Lava Jato permanece na cabeça dos brasileiros. As últimas prisões e os depoimentos vazados das testemunhas de alto nível frequentemente dominam os noticiários.
Antunez disse que irá abordar o drama desde o início, quando a polícia descobriu que uma quadrilha movimentava dinheiro do mercado negro usando um posto de gasolina em Brasília – com uma pequena ideia de onde a investigação poderia chegar.
“É uma história muito complexa, não só porque muda todo dia, mas porque isso começou como uma pequena investigação”, afirmou Antunez em uma entrevista em sua produtora no Rio de Janeiro. “Estamos fazendo instantâneas o tempo todo para conseguirmos compreender”.
As filmagens começaram este mês em Curitiba, cidade onde a equipe da Lava Jato se concentra.
Uma série ainda sem nome produzida pelo Netflix também deverá estrear no próximo ano, com direção de José Padilha, um dos cineastas brasileiros de maior sucesso.
Títulos como “Tropa de Elite” e “RoboCop” estão entre suas produções e, recentemente, a série da Netflix, “Narcos”, sobre a vida do traficante colombiano Pablo Escobar, se juntou a essa lista.
Entretenimento ou política
A Lava Jato pode se tornar uma ótima história, mas também é um campo minado político. Alguns brasileiros acreditam que os investigadores liderados pelo juiz Sérgio Moro tem focado desproporcionalmente em figuras da esquerda do país.
Luiz Inácio Lula da Silva, o popular presidente de esquerda que governou entre os anos 2003 e 2010, tem sido alvo de diferentes acusações de corrupção, que teriam motivações políticas.
Uma grande polêmica agitou a mídia brasileira no mês passado quando foi divulgado que Wagner Moura – um dos grandes atores brasileiros – se recusou a interpretar Sérgio Moro na série da Netflix.
Tanto Padilha quanto Moura, que faz Pablo Escobar em “Narcos” e também atuou em “Tropa de Elite”, negaram ter discutido sobre o papel.
O blog de esquerda O Cafezinho sugeriu que a versão do filme de Antunez será uma ferramenta de propaganda a favor da polícia.
A página apontou como exemplos o grande orçamento pouco usual para os padrões brasileiros – 13,5 milhões de reais em comparação com os típicos R$ 5 milhões – e o acesso da produção à operação em Curitiba.
“Será que se alguém quiser fazer algum filme crítico sobre a Lava Jato também poderá fazer um acordo de cooperação com a polícia?”, questionou O Cafezinho.
Lado humano
Antunez disse que os produtores do filme poderão ver o interior dos escritórios em Curitiba, apesar de só poderem filmar o lado de fora. Eles também contarão com a ajuda da polícia em cenas que envolvem oficiais armados e helicópteros.
Mas as inúmeras entrevistas com agentes e promotores significam que o script será “muito factual”, afirmou Antunez. Tratar os oficiais como celebridades não é a ideia.
“Eles são pessoas. Eles não fantasiam que o que fazem é maior do que é na realidade – eles não falam sobre salvar o país ou coisas do tipo”, disse.
O maior desafio, de acordo com Antunez, é saber onde parar a história. Provavelmente escolherá o momento de grande tensão quando Lula foi detido brevemente em março para depor.
A Lava Jato tem chocado muitas pessoas desde que começou e é provável que continue assim.
“A intenção dos produtores é que haja uma sequência”, comentou Antunez.
E enquanto os deputados – muitos dos quais enfrentam acusações na Lava Jato – querem que a investigação seja fechada, Antunez espera que seu filme mantenha a pressão pública.
“Não estou preocupado como diretor, mas como cidadão que sou”, disse. A investigação “precisa continuar o seu caminho”.
Isto é