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Televisão ‘descobre’ narrativas bíblicas e conquista o público

As narrativas bíblicas já foram contadas em vitrais de janela e relevos nas portas das catedrais, peças de teatro feitas por monges e histórias em quadrinhos. Mas só agora estouraram na mídia preferida dos brasileiros: a telenovela.

Foi com “Os Dez Mandamentos” que a Rede Record conseguiu bater a Rede Globo em Ibope na semana que passou. Na terça-feira (10), foi ao ar a esperada cena em que Deus abre o Mar Vermelho para o povo hebreu fugir dos egípcios, sob o comando de Moisés.

A média no horário nobre foi de 28,1 pontos contra 20,8 da Globo, em São Paulo (cada ponto equivale a 67 mil residências na capital paulista).

Depois das minisséries “A História de Ester”, “Sansão & Dalila”, “Rei Davi” e “José do Egito”, apostar em uma novela bíblica foi um acerto por parte da Record, o que estaria levando a Globo a repensar suas escolhas de público e temas.

Guiados pelo bispo proprietário da Record, Edir Macedo, os fãs do folhetim receberam um recado: a novela “não é uma cópia fiel da Bíblia”, já que há “romance por trás da história”, diz o aposentado João Maria Barbosa, evangélico que não perde um capítulo com a família. “Mas o conteúdo central é o que a Bíblia ensina.”

De fato, mesmo com as surpreendentes dez pragas enviadas por Deus enquanto o faraó egípcio reteve o povo hebreu como escravo, o enredo fartamente conhecido requeria certa dramatização – “fazer novela”, no dito popular. Pois esse elemento foi suprido pela Record com a ficcionalização de personagens e famílias egípcias e hebreias.

Outro elemento que garante o funcionamento do melodrama ocorre quando finalmente os escravos são libertados e deixam o Egito: alguns hebreus ficam para trás enquanto poucos egípcios seguem o Deus de Moisés, o que permite a continuidade dos dois núcleos da trama.

“Na pós-modernidade os grandes relatos foram abandonados, mas a saga mostrada pela novela adquire importância por inserir pequenos relatos dentro do todo maior: paixões, famílias, amores proibidos, o que atrai a atenção”, diz o teólogo Robert Rautmann à Gazeta do Povo.

A superprodução conta com figurinos de época, câmeras que vêm do alto, de baixo e dos lados, fotografia excelente, sem falar na apoteose de efeitos especiais na abertura do Mar Vermelho.

“Efeitos especiais de primeira e direção de arte justíssima. Cores, coreografia, etc., tudo muito bonito. Eu penso que a Record, com esse trabalho, abre uma nova ordem para as novelas brasileiras e suas produções”, diz o diretor de teatro Edson Bueno, que é fã das duas versões de “Os Dez Mandamentos”, de Cecil B. DeMille, modelo para todas as representações do livro do Êxodo que vieram depois.

Outro motivo do sucesso está ligado ao crescente público evangélico ou simpatizante, incluindo gente que não via novela antes.

“Traz um pouco de esperança, ou pelo menos direciona para a reflexão de que a vida pode ser melhor”, diz João Maria Barbosa.

Temas como perdão, ciúmes, egocentrismo foram abordados por meio das microtramas, tanto no núcleo egípcio quanto no hebreu, ou seja: nem todos os egípcios são retratados como vilões, nem todos os hebreus, como mocinhos. Ponto a favor.

Grotesco

Por outro lado, a interpretação dos atores selecionados se mantém tão artificial quanto em tantas outras novelas. O melodrama é rasgado, dura longos minutos – mas tem a vantagem de ser alternado com as cenas de suspense das sentenças de morte, perseguições no deserto em câmera lenta e chagas de pele por todo o rosto, entre outras pragas.

O inusitado dos hábitos de uma época que a tradição situa por volta do ano 1.500 a.C. provoca cenas grotescas – o que pode ser visto como um atrativo.

Foi o caso da urna contendo os ossos de José, carregada na fuga dos hebreus ao deserto, seguindo o relato bíblico.

Isso sem falar nas dez pragas impostas por Deus a Faraó e seu povo até que libertasse os escravos, incluindo figurantes cobertos de insetos, rãs que invadem a cidade e o Nilo transformado em sangue.

A novela termina dia 20 de novembro, mas volta com uma segunda temporada em março.

 

GAZETA DO POVO

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Aécio Novitski

Idealizador do Site Araucária no Ar, Jornalista (MTB 0009108-PR), Repórter Cinematográfico e Fotógrafico licenciado pelo Sindijor e Fenaj sobre o número 009108 TRT-PR

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